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Foto de Manuh Mourão |
Bernardo Guimarães retratou em seu livro:
Histórias e Tradições da Província de Minas Gerais, como nasciam
algumas Capelas da Santa Cruz e a devoção em torno delas.
Aqui deixo para vocês a introdução do conto:
A Filha do Fazendeiro, que
poderá ser acessado em sua integra no link que irei disponibilizar abaixo.
Assim nasceu uma Capelas da Santa Cruz:
"Maio de 1867
A cinco ou seis léguas ao norte da cidade de
Uberaba na província de Minas Gerais se via ainda há alguns anos uma capelinha
isolada ou ermida no alto de um espigão, dominando por todos os lados um largo
e risonho horizonte como atalaia imóvel olhando em derredor as solidões. Era
uma pequenina e tosca construção de madeira com quatro paredes, coberta de
telha e coroada por uma cruz, como se encontram muitas disseminadas por esses
vastos sertões.
Essas capelinhas têm de ordinário junto a si
um cercado de pedra ou de madeira, que serve de cemitério aos fazendeiros
vizinhos. Quando se diz – vizinho – naquelas paragens, e principalmente em eras
mais remotas, entende-se moradores de cinco, seis, sete e mais léguas em redor.
A capelinha, a que nos referimos, tinha
também junto a si o seu terreno sagrado, cercado de muro de pedra, e com uma
cruz no meio, e era ali, que os fazendeiros daqueles contornos mandavam
enterrar os seus defuntos, para se forrarem ao trabalho de mandá-los viajar
dezenas de léguas levando-os aos povoados onde houvesse cemitérios sagrados.
Esta, porém, não foi erigida especialmente para esse fim, como se verá pelo
decurso desta história.
Do alto da capelinha enxergava-se em
distância de cerca de meia légua em um aprazível vargedo a fachada denegrida
arruinada de uma grande fazenda, com seus vastos currais, senzalas, moinho e
engenho de cana, mas tudo a desmoronar-se, tudo abafado entre o matagal, que
começava a tomar conta do terreno com a vigorosa e luxuriante vegetação, que há
naquelas regiões. A fazenda achava-se situada ao pé de um lançante entre duas
vertentes orladas de filas de coqueiros chamados buritis, cujas linhas se
perdiam na imensidade dos horizontes como fileira de guerreiros selvagens
postados em ordem de batalha ao longo dos chapadões. As terras de cultura ou
matos de plantio eram mais longe, nas escuras matas, que acompanham as margens
de um ribeirão, que vai desaguar no Rio das Velhas.
A algumas centenas de passos além da
capelinha havia à beira do caminho uma cruz de pau toscamente lavrado, e via-se
claramente que ali havia uma sepultura. Existindo ali tão perto uma capela e um
recinto sagrado para se enterrarem os mortos, por que razão fora ali sepultado
aquele corpo, assim segregado dos outros hóspedes do túmulo?
Aquele lugar tinha reputação de
mal-assombrado, e agente daqueles contornos, que bem sabe disso, evita o mais
que pode passar por ali depois de noite fechada. Um, que por desgraça teve de
passar por lá a desoras, quase que lá ficou morto de medo fazendo companhia ao
enterrado. Contou, que vira sobre a sepultura levantar-se um fantasma monstruoso,
o qual depois de exalar um gemido prolongado e lamentoso como o uivo de um
cão, arrebentou dando um estouro como de um tiro, e desmanchou-se em línguas de
fogo vivo, que passearam por algum tempo por cima da sepultura, e sumiram-se um
momento depois.
Se o leitor deseja saber que acontecimentos
deram lugar ao abandono daquela linda fazenda, e qual o mistério que encerram
aquela sepultura e aquela capelinha, leia a seguinte história, que há tempos me
foi contada por um morador daquelas paragens, e que eu tratarei de reproduzir
com toda a fidelidade e individuação, que a memória me permitir."
(http://www.literaturabrasileira.ufsc.br/_documents/0006-00770.html)
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